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A cultura do erro


Você já ouviu falar em “cultura do erro”? Antes de ir para as definições é bastante saudável que tenhamos uma discussão anterior para compreender de que maneira vemos o erro no nosso dia a dia. E depois de entender como vemos, precisamos pensar em formas de solucioná-lo, pois o erro sempre gera custos extras e um desgaste emocional. Ao abraçar o erro como uma forma de aprendizado, podemos resolver a maioria dos problemas.

Quando criança, aprendemos que o erro faz parte do aprendizado. Aprendemos que é errando que descobrimos nossas falhas e podemos corrigi-las. Desconheço qualquer educador que diga o oposto e prefira em sala de aula o aluno que copie a matéria do amigo por puro medo de errar. Mas essa fase de acolher o erro não atinge todos igualmente. Algumas pessoas têm dificuldade de lidar com eles já em fase escolar, talvez por não terem aprendido que está tudo bem em errar, ou talvez porque tenham um espírito mais competitivo e queiram ser os melhores. Quem sabe essas crianças sejam inseguras e tentem esconder alguma coisa atrás de exercícios muito bem feitos, cadernos perfeitamente copiados e notas brilhantes. Ou talvez não seja nada disso e a pessoa correta para falar sobre esse assunto sejam os psicólogos.

Uma vez que esse período de aprendizado passa, começamos a interagir com cobranças maiores. Os pais cobram mais e os amigos também. O erro passa a originar algumas espécies de frustrações como quando, por um erro de passe, deixamos de marcar aquele ponto no campeonato intercolegial de vôlei e perdemos o set e perdemos a medalha de ouro. Errar assume uma aura negativa, porque falhamos e falhar não é bom. Nenhum herói terminou o filme com aquele efeito de palmas lentas e música encantadora se errou no último golpe da luta. O erro do mocinho, implica no acerto do vilão. E sem que possamos perceber, esse tipo de análise reduzida da realidade passa a tomar conta da forma como lidamos com as experiências.

Continuamos crescendo para aprender que o erro na prova adquire um novo sentido: ele não educa mais e apenas mostra que você não estudou o suficiente. Então você precisa parar de errar e a melhor forma para isso é estudar mais, se dedicar mais, treinar mais, memorizar mais, fotografar mais, postar mais, curtir mais e ser mais curtido. Errar em qualquer ponto, assim aprendemos, pode determinar se você entra ou não naquele vestibular concorrido e difícil. Somos programados para tentar, como diria a poetisa Jarid Arraes. Nos esquecemos que é possível desistir e que é possível errar.

Mas você pode achar que na vida empresarial é diferente, pois as empresas modernas já não ligam mais para os erros e que esse tipo de gestão que pontua o que é correto e o que não é está realmente ultrapassada. Eu concordo com você. O caráter punitivista gerou prejuízos enormes para organizações do mundo inteiro e beneficia apenas aquelas lideranças tóxicas, que não encontrarão lugar no mundo 4.0. Todavia, nem sempre nos dispomos a aprender quando os erros aparecem e nem mesmo estamos dispostos a encarar o erro que está em nossa frente. Porque olhar para ele significa admitir que somos falhos ou que o processo que desenvolvemos é falho. Significa tomar a consciência de que é preciso mudar e qualquer passo depois desse que não seja no caminho de uma mudança será visto como omissão ou falta de responsabilidade.

A cultura do erro é ovacionada no Vale do Silício e você leu sobre isso quando leu “A menina do Vale”. Certamente ouviu falar dessa ideia quando leu sobre as startups, pois, realmente, errar é fundamental para que os jovens aprendam sobre o mercado, sobre a vida empresarial e sobre as frustrações do empreendedorismo. Isso não quer dizer que nossas empresas têm capital disponível para arcar com todos os erros de colaboradores, gestores e dirigentes, e nem mesmo que todo erro é benéfico para a companhia. A questão chave sempre será: o que eu aprendi com essa experiência?

Mas não podemos parar por aí.

Até alguns anos, muitas empresas evitavam falar sobre os erros e preferiam focar nas boas práticas, sob o risco de criar uma cortina de fumaça perante os verdadeiros riscos que permeiam a organização. Conforme adquirimos a disposição para falar sobre os erros e dificuldades, passamos a ver que alguns deles são tão comuns que podem quase virar um padrão. Você quer um exemplo? Que empresa nunca errou na contratação de um novo colaborador antes de elaborar, por escrito, uma lista de habilidades e competências esperadas para o cargo? Se nunca tivesse errado, não haveria necessidade da descrição. E você têm ideia de quantas empresas reclamam sobre a dificuldade de encontrar os colaboradores corretos? É somente a partir do momento em que nos damos conta de que não sabemos de tudo ou de que nossas empresas (ainda) não funcionam adequadamente se nós não estivermos lá que percebemos como acabamos varrendo alguns erros para baixo do tapete com qualquer desculpa que esteja na moda.

Então por que insistir em falar sobre cultura do erro quando os erros, na verdade, devem ser corrigidos? Porque errar implica mais do que o crescimento pessoal. O erro nas empresas vai além da ideia de precisamos dele para crescer profissionalmente ou aprender algo na esfera pessoal. O erro é o gatilho para a elaboração de um plano de ação capaz de resolvê-lo. Esse é o ponto de virada.

As ferramentas para resolver o problema são variadas e dependem do tipo de cultura que tem a sua empresa, sem considerar os modismos. Se você tentar resolver um problema com design thinking sem que essa filosofia esteja inserida em todos os setores do negócio de forma estrutural, provavelmente você terá um novo problema (senão mais de um). Para iniciar, aposte nas ferramentas de base que podem dar autonomia para os colaboradores. O 5W2H, por exemplo, é uma excelente forma de corrigir os erros mais frequentes e apontar caminhos através de um plano de ação. Se você não está familiarizado com o termo, vamos a uma explicação rápida: o responsável pela identificação do problema deve elaborar um plano de ação que constitua na identificação do que será feito (what), por que será feito (why), onde será feito (where), quando será feito (when), por quem será feito (who), como será feito (how) e quanto vai custar (how much). Embora algumas coisas pareçam óbvias, não podemos esquecer que o óbvio também precisa ser dito em algumas circunstâncias.

A partir desse plano de ação podem ser pensadas mudanças mais profundas na empresa ou ainda podem ser levantadas soluções simples para problemas que pareciam muito complexos. Os erros, portanto, adquirem a perspectiva de aprendizado e são corrigidos em tempo hábil para que os custos sejam minimizados. Se os erros forem recorrentes, provavelmente o 5W2H será uma solução momentânea e será preciso que os gestores pensem em soluções um pouco mais complexas, por vezes até estruturais como o redesenho de um fluxo de processos, a reformulação de uma política, ou uma nova necessidade de treinamento.

Seja qual for a complexidade da solução, a identificação do erro e sua correção não podem parar. O erro não deve ser estimulado, mas sua cultura precisa avançar para abranger as mudanças necessárias para que sua ocorrência seja reduzida.


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