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A opinião do outro ajuda mesmo?


Diariamente somos bombardeados por postagens, discussões e ideias sobre todos os tipos de assuntos. Alguns nos interessam mais do que outros, mas não é difícil se sentir quase na obrigação de esboçar uma opinião formada sobre questões que nem sempre queremos debater ou entendemos o suficiente. Na busca por fazer parte e ser relevante, podemos nos distanciar de nós mesmos.

Por isso, conversamos com a coach de liderança Liz Cunha, cujo trabalho é focado em desenvolver pessoas e reconectá-las ao que realmente importa individualmente.

liz cunha

Êxito: A partir da sua experiência, você considera possível dizer que as pessoas estão mais perdidas ou com mais dúvidas do que tinham antigamente?

Liz Cunha: Nós vivemos na era digital, que além das inúmeras facilidades que aportou para nossa vida também nos colocou na era da velocidade, da resolução de problemas e da desorientação. Em primeiro lugar, temos a velocidade de informação. A globalização e o avanço da internet nos permite acompanhar em tempo real os acontecimentos do outro lado do planeta. Isso é extremamente positivo à primeira vista, já que nos mantém informados e permite agir com antecipação, mas também gera vulnerabilidade. Acrescido a isso, temos gigantescas mistificações ampliadas espetacularmente pela força irresistível e crescente da mídia, que apresenta a mentira como verdade (fakenews), o duvidoso ou falso como certo, o de pouco valor como valioso, operando nas cabeças uma lavagem cerebral que as torna incapazes de decidir com autenticidade e responsabilidade por suas opções em qualquer área da vida.

Também temos que lidar com a velocidade dos processos. Já que conseguimos realizar as coisas com um simples toque na tela, queremos resultados rápidos, muitas vezes às custas da agilidade dos processos. O foco está na conclusão, no resultado. Percebemos um afastamento das virtudes da produtividade por meio do pensamento crítico e reflexão e a preferência por soluções pré-estabelecidas, passo a passo ou dicas, cujo valor consiste em produzir efeitos imediatos. 

Seguidamente, na condução inicial dos processos de desenvolvimento, ouço dos meus clientes/aprendizes: “OK, eu consigo. Então, tudo o que devo fazer agora é...”. Essa tendência de elaborarmos declarações de ação em vez de recorrermos à reflexão é um efeito do que nós chamamos de operacionalismo. As pessoas estão mais interessadas naquilo que elas devem fazer ao invés de questionar o porquê e se querem fazer tal coisa. 

Centrar a atenção e ação naquilo que aparentemente funciona pode parecer inteligente, mas percebam que nessa busca desesperada por resultados rápidos, o indivíduo e seu complexo processo de pensamento são vistos como um obstáculo à implementação bem-sucedida de processos que possam depender da pessoa. No mundo interior, conflitos inconscientes e pensamentos reflexivos são lentos e representam entraves para aquela que se pretende ser a geração da resolução de problemas, mas de fato, é uma época em que a dimensão humana tem sido radicalmente diminuída.

Assim diante da overdose de informação diária, a velocidade dos processos e das cobranças por resultados rápidos e astronômicos, com uma capacidade limitada de reflexão, decisão e força de trabalho, parece lógico que as pessoas sintam-se desorientadas, perdidas e com muitas dúvidas sobre qual caminho seguir.

Êxito: A facilidade de fazer perguntas e trocar experiências na internet poderia contribuir para eliminar as dúvidas das pessoas?

Liz Cunha: Eu questiono se realmente as pessoas estão buscando uma troca de experiências rica que possa de fato eliminar suas dúvidas. O que é mais evidente é que elas buscam:

1. Um inquestionável conjunto de instruções para fazer isso ou aquilo. Diariamente recebo questionamentos sobre “Qual o passo a passo para o autoconhecimento?” ou “Que dicas eu daria para iniciar um processo de mudança”. Numa era onde o indivíduo é avaliado quase que exclusivamente pelo resultado financeiro que produz e pela tendência ao operacionalismo, fica evidente essa busca incessante por soluções mágicas trazidas por “aqueles que já percorreram o caminho das pedras”.

2. A validação daquilo que estão propensas ou dispostas a fazer. Ou seja, buscam aliados que concordem com a sua escolha.

3. O que a maioria está fazendo. Se analisarmos a história perceberemos que sempre se acreditou que o correto, o justo, o bom e o normal é o que a maioria pensa, quer, faz e decide. As pessoas guiam a sua vida a partir daquilo que “todo mundo faz” e não a partir da sua autenticidade e discernimento.

Outra questão é o pouco compromisso com as informações e opiniões sobre os mais variados assuntos disponibilizados na internet. Vivemos nessa realidade virtual com diferentes avatares do “eu” e não precisamos estar profundamente envolvido com aquilo que está sendo escrito ou compartilhado. As postagens nas redes sociais são fotos instantâneas dos nossos envolvimentos no mundo real, não virtual. A limitação do número de caracteres induz a descrições rápidas e superficiais. As conversas via aplicativos ou até mensagens privadas das redes sociais mantém as pessoas em contato, mas não próximas umas das outras. Pouco sobre mim é revelado. Pouco do outro está envolvido. Não há uma comunicação profunda e verdadeira. O que presenciamos são trocas provenientes de porções superficiais da mente e isso não é suficiente para eliminar as dúvidas das pessoas.

Êxito: Existem grupos de apoio para todo tipo de problema na internet. Eles ajudam mesmo? Quais são os cuidados que devemos ter ao ingressar neles?

Liz Cunha: Eu acredito muito na força do grupo e na energia transformadora que se produz quando estamos todos olhando para a mesma direção em busca de respostas, caminhos, possibilidades. É uma contribuição genuína e simultânea de diversos talentos, habilidades e saberes. Obviamente nos grupos presenciais existe a vivência e essa não pode ser suprida pelas trocas que acontecem online. 

Em 2020 tive a oportunidade de participar como aluna e também acompanhar como tutora alguns grupos e ministrar palestras online. E devo dizer que o objetivo soberano de todos eles foi atingido: compartilhar conhecimento, gerar reflexões, acompanhar processos de mudança. Esse conhecimento recebido via internet precisa ser aplicado e observado no mundo objetivo. Para que ele adquira a dimensão do seu valor real, precisa implicar a imersão do indivíduo em uma realidade prática. Os cuidados que devemos tomar ao ingressar em um grupo virtual são os mesmos para grupos presenciais:

1. Buscar referências sobre a formação, experiência e profissionalismo do profissional que conduz;

2. Evidências/testemunhos de outros participantes;

3. Contrato ou documento similar onde você concorda em participar e onde a outra parte se comprometa com o sigilo das informações pessoais dos participantes.

Em grupos online devemos ter cuidado redobrado, porque nem tudo é o que parece. Muitas vezes por trás daquela publicação mais elaborada está um profissional menos qualificado. Por isso a busca pelas referências deve ser um compromisso assumido com você mesmo para que aquilo que você busca seja atendido na sua plenitude. 

Êxito: A internet, embora ajude, também é um território bastante hostil. Que dicas você poderia dar para quem tem o hábito de pedir ajuda aos demais pelas redes sociais?

Liz Cunha: Para responder a essa pergunta, parafraseio uma mestre que conduziu a mudanças significativas na minha forma de ver e viver a vida: “Conselho é a coisa mais devastadora que se pode fazer para alguém.” Leia-se por “conselho”, dicas ou opinião sobre algo. Porque quando você dá um conselho, você fala a partir do teu cenário, da tua visão de mundo, das tuas vivências e dos teus valores, que podem não coincidir com os do outro. Portanto, não ajudarão, apenas o colocarão ainda mais em dúvida. 

O que percebo que fez diferença para mim e faz diferença para clientes e aprendizes que eu acompanho são:

1. Tomar consciência de que, em processos de mudança, somente cada um de nós, pode fazer algo por si mesmo.

2. Sair do pensamento horizontalizado e da homogeneização  promovidos pela globalização. A identificação e a fusão com outros tantos milhões de pessoas que se encontram “na mesma página”, compartilhando os mesmos noticiários e séries do Netflix, nos dá a sensação de que se é parte de uma norma coletiva.

3. Questionar. Questionar as informações que chegam até nós diariamente pelos diferentes veículos e vias de comunicação, as nossas “verdades”, a forma como eu me relaciono, trabalho, produzo, projeto e vivo. Esse questionamento e autoindagação constantes irão ampliar a nossa visão e nos possibilitará enxergar com clareza o que é e as opções que temos a partir daí.  

Em resumo, conecte-se com você, com o seu sentir e a sua intuição e saberá qual é o seu melhor caminho. Ou como diria Tales, que foi repetido por Sócrates: “Conhece a ti mesmo”. A opinião do outro é apenas a opinião do outro. Ela não representa real ajuda. É uma ilusão. Segundo Freud, “acolhemos ilusões porque elas nos poupam de sentimentos desagradáveis e nos permitem desfrutar de contentamentos”. Cabe a você escolher se quer continuar vivendo na Era da Desorientação e da Ilusão, buscando uma enxurrada de opiniões na internet ou se quer criar um caminho de verdade, a partir do teu sentir, para buscar as respostas que tanto deseja.

 

liz cunhaSiga a Liz Cunha nas redes sociais @cunhaliz @cunhaliz

 

 

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