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A temida era do cancelamento


Há tempos vivemos uma era sombria na internet. As redes sociais que foram criadas por seus idealizadores como uma forma de interação e compartilhamento de notícias e informações, tornaram-se palco para grandes discussões. Apesar de ressaltar que a liberdade de expressão é essencial para que as pessoas possam se expressar e lutar por suas causas, ensinando as pessoas e promovendo um despertar coletivo, a cobrança excessiva pela perfeição, somada a falta de respeito com as opiniões alheias, criou a era do cancelamento.

Em 2019 a “cultura do cancelamento” foi eleita pelo Dicionário Macquarie como termo do ano. Esse dicionário é um dos responsáveis por selecionar as palavras e expressões que mais moldaram e tiveram relevância sobre o comportamento humano todos os anos. Os termos são selecionados por um comitê de linguística, especialistas e teóricos elecionados pela instituição, que formam uma lista de quatro termos, que também é submetida ao voto popular. 

Para o Dicionário Macquarie a cultura do cancelamento é um movimento que ganhou espaço nas redes sociais e tem a iniciativa de conscientizar a população sobre falas ou atitudes de cunho preconceituoso ou posturas consideradas inaceitáveis vindas de artistas, políticos, empresas ou personalidades públicas, o que causa uma interrupção no apoio e na admiração. As atitudes que mais acarretam espanto e geram essa onda são de cunho ideológico e comportamental. 

Se você está exposto nas redes sociais já está propício a ser cancelado. Esse cancelamento é considerado um boicote, ou seja, deixa-se de seguir a blogueira, não se compra mais produtos ou contrata serviços de uma determinada empresa, não se ouve mais aquele artista, ou deixa-se de ver filme estrelado ou dirigido por aquele ator na Netflix. Algumas pessoas ainda vão muito mais longe quando esse assunto está em pauta e pedem a expulsão dos artistas dos sets de filmagem, o impeachment de políticos e até o linchamento de algumas pessoas. 

Geralmente as pessoas exigem que figuras públicas se posicionem a respeito de todas as questões sociais e políticas, por conta da sua relevância no universo que atuam, levando-os a serem agentes transformadores dentro da sociedade, capazes de conscientizar e promover mudanças de pensamento e comportamento. O público espera que eles deixem claro: seu posicionamento político, quais causas apoia e quais não apoia e os porquês disso, sua orientação sexual e suas escolhas pessoais. E é exatamente tudo isso que faz com que uma pessoa seja idolatrada ou cancelada, por pessoas ou grupos, gerando uma grande confusão nas redes sociais.

O que podemos observar de forma bastante evidente é que no caso de pessoas conhecidas nacional e internacionalmente essa cultura do cancelamento vai direto em um fator importante: o dinheiro. Partindo do pressuposto de que “as pessoas só aprendem, quando sentem no bolso”, busca-se fazer com que contratos sejam cancelados, perca-se apoio de marcas, clientes, consumidores e fãs. Geralmente os cancelados demoram para conseguir construir sua credibilidade novamente, como figura pública. Toda essa perda é muito compreensível quando alguém comete um crime, como nos casos de racismo e estupro/assédio por exemplo. Porém, existe uma diferença gigante entre punir alguém que cometeu um crime e alguém que apenas deu sua opinião ou demonstrou seu descontentamento com alguma situação. 

O que precisa ser analisado em primeiro momento, antes de sair por ai cancelando alguém são as seguintes questões: 

 

O que a pessoa disse é de cunho preconceituoso? 

Se a resposta for sim, precisamos compreender que aquilo não é uma opinião, por que ofende a moral de alguém simplesmente por ser como é. Isso envolve questões como: orientação sexual, questões de gênero, raça, classe econômica, religião e regiões de onde a pessoa vem. 

 

A pessoa que fez o comentário, o fez por que é preconceituosa ou ignorante? 

Conseguimos ter essa resposta promovendo um debate saudável e instrutivo relacionado ao tema. Se a pessoa conseguir compreendê-lo e se retratar pelo ocorrido ou pelo menos concordar em pensar sobre o que foi dito, foi apenas ignorância ou um equívoco e mais uma pessoa foi conscientizada. Se ela continuar batendo na mesma tecla e ainda te ofender, ela é preconceituosa. 

 

A frase não foi tirada de contexto? 

Vemos nas redes sociais muitos vídeos cortados e frases (principalmente tweets) de pessoas que são colocados apenas em partes. O que pode sair completamente do contexto tanto do que estava sendo debatido, quanto do que foi realmente dito. Nós precisamos entender, sobretudo, que nada nessa vida pode ser entendido de maneira totalmente literal. Por isso que é tão importante aprendermos a nos comunicar de maneira eficiente, sem rodeios e alertando quando algo é uma sátira, por exemplo. Precisamos absorver o que foi dito e pensar a respeito. E antes de julgar é preciso tomar todo o cuidado sobre onde as informações que foram divulgadas e por quem, buscando a informação completa, para podermos tecer nossa análise e nossa crítica. Em tempo: cuidado com as fake news! 

 

Eu consigo compreender o outro como ser humano? 

Essa pergunta é primordial nesse processo, pelo seguinte fato: pessoa nenhuma é perfeita. Todos nós somos passíveis de erros. Seja falando alguma besteira, sendo preconceituoso em algum momento da vida, seja sendo mal interpretado pelas pessoas que nos leem ou nos escutam, seja fazendo algo impensado que ofenda alguém ou algum grupo de alguma maneira. É muito fácil sermos críticos com os outros e apontarmos os seus defeitos, principalmente quando pertencemos ao mesmo grupo e temos uma identificação, porque não queremos que os outros nos vejam naquela pessoa, por não concordarmos com seu jeito ou com seu pensamento. Por isso é tão importante tratar o outro como uma pessoa e aprender a interpretar quando ela está sendo maldosa e quando só está perdida. Tudo isso acontece porque junto com a era do cancelamento, existe a era da perfeição. As redes sociais criaram na nossa cabeça uma falsa sensação de que as pessoas que estão sobre os refletores e holofotes, têm vidas perfeitas, com corpos perfeitos, casas perfeitas, relacionamentos perfeitos e uma saúde mental super em dia. Esquecemos que nas redes nós só mostramos nossas alegrias e coisas positivas ao nosso respeito, as nossas dores guardamos para o dia a dia. 

Nós precisamos compreender que todas as pessoas são ignorantes pelo menos em algum assunto e mesmo que elas não façam parte de um grupo, se já lutam pela causa são um apoio importante e que precisamos dar espaço para que todos possam evoluir, alguns de maneira rápida, outro de maneira mais lenta, mas todos merecem uma oportunidade de aprender. E é aquele velho ditado: antes de falar dos outros, observe primeiro a ti mesmo!

 

Larissa Lucian


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