Grandezas editoriais nas pequenas cidades do Brasil
Angela Zatta, da editora Êxito, de Videira, cidade do oeste de Santa Catarina com pouco mais de 50 mil habitantes, conta suas vivências e como os cursos EaD iluminam suas decisões editoriais.
A editora Êxito tem suas particularidades e coincidências com relação a outras editoras no país. Entre as coincidências, as buscas por novos projetos, por alcançar leitores, por profissionalizar e melhorar sua produção, do texto ao design, da relação com autores às vendas. Entre as particularidades, o fato de não estar geograficamente no olho do furacão, onde o mercado gira mais forte: Rio-São Paulo-Belo Horizonte-Recife. A Êxito é de Videira, cidade com pouco mais de 50 mil habitantes, no interior de Santa Catarina. E essa é a boa notícia, já que no Brasil, entre cerca de 5.500 municípios, pouco mais e 300 têm população superior a 100 mil habitantes.
No entanto, não é fácil, como conta a editora Angela Zatta na entrevista. Ela vem fazendo cursos na LabPub e narra como vem aplicando esses conhecimentos no dia a dia da empresa, alimentando também os projetos e a própria capacidade de adaptação à atual crise.
LabPub — Vejo no site que a Êxito é uma agência de comunicação, além de editora. O que nasceu primeiro como negócio?
Angela Zatta — Na realidade, o negócio nasceu como uma revista chamada Revista Êxito, com a proposta de compartilhar boas experiências das empresas e profissionais da região. Com o passar dos anos percebemos uma demanda pelos serviços de agência, até para suprir as necessidades de mídia da revista, pois muitas empresas não têm agência de publicidade ou um setor de marketing estruturado. Estamos preparando a edição número 100, depois de passar por diversas mudanças no projeto gráfico e de criar um site para acessar as matérias virtualmente. O público do interior, ao menos aqui, ainda acredita muito no material impresso, como se houvesse uma confiabilidade maior. Logo, começamos a ser procurados para produzir livros de autores independentes ou livros de famílias. Já publicamos memórias, histórias familiares, genealogias, estudos históricos que têm uma demanda realmente local. Nos últimos anos, produzimos livros próprios, com redação da nossa equipe, e conseguimos aprovar um projeto pela Lei Rouanet para publicar um livro sobre o município, produzido por nós. Também fomos procurados para publicar livros de ficção, poesia, entre outros.
LabPub —Quais os planos para a publicação de livros?
Angela Zatta — Mesmo sendo uma editora independente, buscamos oferecer uma experiência de publicação para os autores que abrange todas as etapas da publicação tradicional. Buscamos analisar o conteúdo, especialmente, e ajudar os autores a colocar o melhor produto possível no mercado, ao invés de apenas diagramar o livro. Mas diante da pandemia e com a contenção geral de gastos por parte da população, buscamos direcionar nossos esforços para publicar ebooks. Em abril, fizemos uma chamada de contos, selecionamos cinco deles com temas variados e passamos a produzi-los para oferecer esse novo suporte ao público. Até o começo desse mês estávamos acertando detalhes com a Amazon para publicação e também editando os textos. Em breve publicaremos os demais que passam por temas religiosos (bastante provocativo, inclusive), violência doméstica, fantasia e históricos.
LabPub —O mundo editorial fora do eixo Rio-São Paulo, mesmo considerando as forças de BH e Recife, é pouco conhecido. Há uma forte vida editorial fora desses centros?
Ângela Zatta — Não posso dizer que há uma forte vida editorial. Não temos grandes eventos literários fora das capitais, embora haja esforços significativos para produzir Feiras do Livro ou eventos similares. Há uma falta de oportunidades para capacitação de autores e de todos os envolvidos na cadeia do livro, o que é um problema estrutural. Mas existem muitos autores dispostos a aprender e muitos leitores que precisam de incentivo.
LabPub —A Êxito está em uma cidade do oeste catarinense com cerca de 50 mil habitantes. É uma exceção ou um exemplo que pode muito bem ser seguido? O que quero dizer: é possível manter uma editora em cidades médias e pequenas? E você diria o mesmo quanto a livrarias?
Ângela Zatta — As cidades médias e pequenas têm sérias deficiências estruturais na formação de profissionais para empreendimentos que fujam da sua demanda principal. Como a nossa região é bastante focada na indústria madeireira, agronegócio e agroindústria, nossa estrutura de formação superior, composta por universidades privadas, busca suprir essas necessidades de mão de obra. Os campi das universidades públicas estão a cerca de 100 km e mesmo com os Institutos Federais ainda é muito difícil manter cursos abertos e docentes ativos. O curso de Jornalismo fechou há anos na região, a Universidade Aberta do Brasil também não vai mais abrir a turma de Letras que costumava oferecer na cidade, e o curso de Design já deixou o design gráfico de lado para ter ênfase em design de produtos. Isso pode tornar mais difícil o trabalho em uma editora que prioriza ter uma equipe fisicamente mais próxima. Com relação às livrarias, elas são poucas na região. Algumas cidades nem mesmo as têm aqui nos arredores. Quando há, como é o caso de Videira, elas têm lutado para se atualizar e oferecer aos leitores produtos mais nichados. Boa parte do público adquire seus livros através da internet ou dos clubes de assinatura. Então eu poderia te dizer que a Êxito é uma exceção nesse momento, mas que se mantém ciente de que precisa manter o olhar para os grandes centros sem esquecer a demanda local que mantém suas operações no momento. Acredito que estamos no caminho.
LabPub —Por fim: cursos EaD sobre o meio editorial estão realmente ajudando editores fora dos grandes centros? Como é para você?
Ângela Zatta — Sem dúvida alguma! Posso dizer por experiência pessoal como tinha uma visão parcial do mercado antes de conhecer esse mundo de EaD sobre o meio editorial. Embora muita coisa seja aprendida na prática, esses cursos cumprem um papel muito importante de mostrar o que já fazemos de certo ou de errado, apontar correções e abrir os olhos para outros mercados. Há alguns anos buscávamos parcerias com distribuidores, mas sempre tínhamos feedbacks negativos com relação às capas, por exemplo, que não tinham apelo comercial já que eram criadas para agradar o autor. Quando fiz o curso de FORMAÇÃO EM PUBLISHER, acabamos remodelando o Planejamento Estratégico da Êxito e mudamos nossa abordagem com os autores. Outra colaboradora da editora, nossa designer e capista, Thais Lucchesi, participou do Curso REAL JOB CAPAS DE LIVROS no início do ano para suprir essa lacuna e nos auxiliou a rever o briefing de capa, de acordo com as orientações do instrutor do curso. Durante a quarentena, participei do curso DE FORMAÇÃO EM EDITOR DE LIVROS ORIGINAIS E TRADUZIDOS e pude identificar e corrigir incoerências e retrabalhos nos processos internos, além de repensar as formas de publicação. Esse tipo de aprendizado específico seria impossível de ter aqui na região se não fosse pelo EaD. Além disso, o contato com os colegas de curso e a possibilidade de ingressar em grupos específicos para discutir oportunidades e desafios do meio editorial é fundamental para não parar no tempo. Foi muito especial para mim poder voltar para a sala de aula e acho que não consigo mais ficar muito tempo sem cursar algo novo.
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