MEI: entrar ou sair?
Ele responde por quase 70% das empresas em atividade no Brasil. O MEI é resultado do sucesso de uma política pública de formalização de atividades informais a partir da Lei Complementar nº128/2008, que não envolve só a economia, mas também vários aspectos sociais como aposentadoria, auxílio doença, entre outros benefícios não cobertos pela informalidade. Além de criar emprego e renda, o MEI representou uma fonte de investimentos públicos e privados que contribuíram para o crescimento econômico.
Estudos do Sebrae indicam um crescimento exponencial do microempreendedorismo no Brasil, que entre 2009 e 2016 representou uma média de quase 1 milhão de novos negócios por ano. Em 2017, o Sebrae apontou que 50% dos MEIs tinha emprego com carteira assinada antes de se tornar MEI, 23% eram empreendedores informais e 13% eram empregados informais. Entre 2015 e 2019, o mercado de abertura de empresas se manteve crescente no país. Com a pandemia de Covid-19, milhares de brasileiros viram no empreendedorismo uma nova oportunidade de renda, mesmo que o número de abertura de CNPJs tenha reduzido no primeiro semestre de 2020. De volta à normalidade, mais de 3 milhões de microempreendedores individuais foram cadastrados em 2021 e outros 2 milhões abriram as portas no primeiro semestre de 2022, dos quais mais de 78% são MEIs.
Mas a questão não é apenas abrir um MEI. Começar qualquer negócio é um grande passo, contudo, não é um indicativo de sucesso. Para falar mais sobre como fazer o seu MEI crescer de forma estruturada, conversamos com duas feras: Anna Paula Scalsavara, gestora do Centro de Inovação de Videira e professora da Unoesc Videira, e Tiago Mattozo, mentor de negócios e diretor de operações na TXM.
Se ver como um empreendedor
Entra geração, sai geração, alguns hábitos ainda são os mesmos: muita gente busca estabilidade. Ter um salário seguro em um emprego estável, sem preocupações extras com faturamento e sustentabilidade do negócio é o sonho de muita gente ou ainda é aquilo que foi ensinado pela família. O pulo do gato é perceber que dá pra empreender mesmo estando empregado.
Segundo Anna Paula Scalsavara, nem sempre as pessoas se vêem como empreendedores. Uma pesquisa do Sebrae de 2019 elencou identificou que o empreendedor brasileiro tem, em linhas gerais, entre 18 e 30 anos, e é movido pela necessidade de ganhar dinheiro, disposto a iniciar um pequeno negócio sozinho ou com pessoas próprias em áreas que permitam ser profissional liberal. Normalmente tem alguma economia que consegue investir no início ou tem conhecimento de alguma forma de captação. No recorte até 24 anos, normalmente encaixando quem ainda está na universidade ou é recém-formado, cerca de 80% já havia cogitado ter um negócio próprio. Mas o mesmo Sebrae divulgou uma nova pesquisa no último mês de março indicando uma mudança nesse perfil: agora o perfil do empreendedor brasileiro é majoritariamente masculino e tem faixa etária entre 25 e 44 anos, em sua maioria com o Ensino Médio completo (47% contra os 28,5% com curso superior completo, o maior índice da série histórica) e renda em torno de menos de três salários mínimos.
Embora as mulheres tenham sido responsáveis pela manutenção das altas taxas de aberturas de empresas nos últimos anos (eram delas 55% das iniciativas empreendedoras em 2020), essa posição caiu depois da pandemia. A jornada de trabalho dentro de casa, o trabalho home-office e a sobrecarga com o ensino remoto dos filhos foram grandes motivadores para a redução, embora a necessidade tenha aumentado.
"Geralmente você está trabalhando no negócio de alguém e chega um momento em que você diz: eu quero isso também!", aponta Anna. É aí que o bichinho te morde. Você observa que algo te incomoda, percebe que pode executar o trabalho de forma diferente, identifica algumas vantagens que o empreendedorismo pode te dar. "Quando você trabalha na empresa de alguém, você ajuda a construir o sonho de alguém e o seu também, na medida em que recebe seu salário, etc. Mas o empreendedorismo vem muito desse não-contentamento, de querer fazer algo que agregue valor para você e seu negócio", indica.
O passo seguinte ao descontentamento é criar seu próprio negócio com um MEI. Se você imagina que o empreendedor deve parar por aí, imaginou errado. "O MEI veio para formalizar quem estava na informalidade, mas acabou sendo usado pelas empresascomo um recurso de contratação. É uma distorção do MEI, válida pela lei, é verdade, mas também é delicada. Já atendi pessoas que foram demitidas e recontratadas como MEI e que continuam trabalhando na empresa da mesma forma, mas sem benefícios como 13º salário ou férias. Isso prejudica que o profissional se veja como um empreendedor, porque na cabeça dele ainda é apenas um trabalhador. Só que não é! Ele tem um CNPJ e na maioria das vezes pode muito mais do que aquilo que a empresa o contrata", conta Anna. A virada de chave do empreendedor, neste caso, é perceber que não é mais um colaborador, mas um prestador de serviços e como tal pode estabelecer limites, negociar preços e buscar mais clientes para fugir das estatísticas que apontam que 90% dos empreendedores brasileiros não têm funcionários e metade deles ganha apenas um salário mínimo (Sebrae/Estadão, 2022). "Por isso eu digo que o MEI é um primeiro passo. Você não é MEI para a vida toda: tem que ter uma meta para crescer", destaca.
Com seu MEI aberto, CNPJ ativo, possibilidade de emitir NF, etc., cabe ao empreendedor buscar aquele conhecimento extra. "Ao sair da informalidade, o profissional precisa buscar conhecimento para crescer, evoluir tendo o MEI como uma base desse processo evolutivo do empreendedor. Tem que ter uma virada de chave para buscar por um Simples, colocar metas para subir os degraus", provoca. Ao olhar para dentro e se ver como um empreendedor, há muito mais espaço para dúvidas do que certezas. Também há mais lugar para pedir ajuda. "Temos movimentos como o Sebrae, as Salas do Empreendedor, tem o Farol Empreendedor que oferece consultoria gratuita para que o profissional veja que está faturando, projete um crescimento, planeje seus passos e cresça de forma estruturada", explica Anna.
As dicas da gestora vem do acúmulo de conhecimentos de sua trajetória. Com uma bagagem do trabalho no Sebrae, Anna esteve à frente do Programa Negócio Certo, que ajudava as pessoas a criar um plano de negócio. "Sempre falo: erra no papel, é mais barato. Não abra uma empresa só porque o vizinho abriu e deu certo. Esses programas existem até hoje, talvez com outros nomes, de forma gratuita, mas são a parte chata da coisa: escrever, planejar, pesquisar, olhar para o concorrente e para você. Todo planejamento vai partir de perguntas que nos tiram da zona de conforto como: Que conhecimento eu tenho sobre esse produto ou serviço que vou oferecer? Onde eu estou localizado? Qual vai ser meu ponto? Vou trabalhar em home-office, e como as pessoas vão me achar? Preciso receber clientes? Quanto eu vou gastar para apresentar meus serviços? Um número grande de empresas morre porque não se planeja e outra parte não morre, mas não cresce, fica no MEI a vida inteira. O que esses programas, gratuitos, ressalto, mostram que o MEI pode escalar o seu negócio e não precisam ser pequenos para sempre!", aponta a gestora.
Utilizar os recursos disponíveis
Para além das mentorias, palestras e programas gratuitos do Sebrae, Santa Catarina vive um momento ótimo para incentivo, estímulo e fomento ao empreendedorismo. De acordo com Tiago Mattozo, existem programas em níveis e áreas distintas. "Existem programas para os níveis de pré-incubação ou ideação, ou seja, para aqueles empreendedores que precisam colocar a sua ideia no papel, testar, que muitas vezes ainda não tem CNPJ. Outros são destinados para a incubação ou aceleração, quando já existe uma empresa, mas também existem dificuldades seja com o modelo de negócio, no portfólio de produtos, na precificação, em algum aspecto comercial, enfim. Também tem opções para a área de tecnologia e outros programas que direcionam recursos financeiros para empresas um pouco mais consolidadas, além de todo apoio desse ecossistema de inovação catarinense através do Sebrae e da Rede Catarinense de Centros de Inovação", aponta.
Ao se envolver com o ecossistema, o empreendedor encontrará caminhos de conteúdo muito rico, ações de network e grandes possibilidades para quem tem a mente aberta. "O empreendedor que está no MEI, ou que ainda nem tem o MEI ainda, deve buscar ativamente esses espaços como Centros de Inovação, Casas do Empreendedor, unidades do Sebrae para se envolver. O ecossistema não tem esse nome à toa, não é uma escolha de marketing. Tem muitos agentes envolvidos com os empreendedores, que são a pela central, tais como instituições de ensino, sociedade civil organizada, o próprio governo, as empresas, todos contribuindo à sua maneira com eventos e trocas de ideias sem grandes envolvimentos financeiros", indica Tiago. Isso significa que depois de se reconhecer como um empreendedor, cabe ao MEI utilizar os recursos que estão disponíveis para crescer e tomar para si um espaço nesse grande ecossistema.
Sair do MEI compensa?
Tiago indica que todos os envolvidos no ecossistema de inovação esperam que os empreendedores superem o MEI em algum momento. É desse desejo que partem todas as iniciativas para promover estrutura e organização para quem está começando, sedimentando seu caminho de MEI para uma microempresa, pequena empresa e assim suscessivamente.
Mas esse pode não ser o caminho ideal para você. "O principal ponto de dúvida sobre sair do MEI é o volume de faturamento que esbarra no teto. Embora ele sempre seja reavaliado e esteja subindo um pouco, hoje batendo na casa dos R$ 81.000,00 anuais, temos que destacar que sair do MEI compensa em casos de um crescimento minimamente exponencial, quando os ganhos possam justificar os custos extras", salienta. Ao crescer e deixar o MEI para trás, o empreendedor precisa entender que seus custos também aumentam, logo deve haver uma preparação do fluxo de caixa e do volume de vendas para acompanhar a evolução sem ficar no vermelho. Tiago diz que muitos microempreendedores individuais se preocupam bastante em se manter na faixa para não estourar o teto por pouco, já que terão que cobrir isso dentro do faturamento, e podem usar essa dor de cabeça como uma oportunidade para buscar uma orientação extra, seja com a sua contabilidade, seja com uma consultoria.
"O que é mais importante é que essa perspectiva de crescimento exista. O empreendedor tem que ver o MEI como uma primeira etapa, um primeiro passo apesar do aumento dos custos, porque virá acompanhado por resultados expressivos", finaliza.
Mas para além dos custos, outras desvantagens do modelo podem levar empreendedores a buscar novas formas de enquadramento empresarial. Como já mencionado, por não ter vínculo empregatício, o MEI não tem direito ao seguro desemprego em caso de encerramento de contrato ou conclusão da prestação de serviços. Além disso, a aposentadoria é limitada à idade (e não por tempo de serviço), com contribuição feita sobre o salário mínimo. Para se aposentar com mais de um salário mínimo, cabe ao empreendedor complementar a contribuição ao INSS por conta própria.
Embora o processo de abertura do MEI seja simples e rápido, com metas para ser ainda mais acelerado nos próximos anos, pode haver alguma burocracia na emissão de alvarás, o que impede a emissão de notas fiscais no período. Já na questão colaboradores, o MEI permite contratar apenas um funcionário, um número que pode ser insuficiente em alguns modelos de negócio. Por fim, caso você precise de um sócio, o MEI também não é para você.
Na dúvida, opte sempre pela orientação especializada do seu contador ou dos mentores disponíveis no Sebrae ou Centros de Inovação da sua cidade. Crescer é uma escolha. Escolha crescer.
Em busca de incentivo ou fomento?
Confira algumas opções disponíveis para fazer sua empresa crescer
• Programas de pré-incubação Cocriation Lab
• Programa Nascer
• Incubadoras nos Centros de Inovação
• MIDITEC
• ACATE
• Programa InovAtiva Brasil
• Programa Centelha
• Inovatur
• Programa Salto
• Programa ALI
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