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Totem


Antes de mais nada, preciso lhe pedir um favor. Quero que leia o meu relato somente ao se deitar, sozinho e a noite... Por quê? Você deve estar imaginando. Bem, logo chego lá...

 

Então... meu pai, assim como meu avô antes dele, ama viajar para alguns lugares exóticos, descobrir culturas diferentes e participar de suas excentricidades. Gosta também de sempre que possível, comprar itens que remetam a suas viagens, a ponto que nossa casa chega a parecer um museu. Coisa de gente rica, acho.

Em sua última viajem, porém, ele se superou. Normalmente ele costumava aparecer com um escudo tribal, um busto de barro ou um vaso decorado com penas... Coisas “normais”... Mas nesta última ele me veio com um totem... Um maldito pedaço de madeira com um metro e meio de altura, largo como um barril e todo trabalhado em carrancas que mais pareciam demônios de onde quer que tenha vindo.

Odiei! Mas, infelizmente, ele estava muito orgulhoso da compra para que eu pudesse admitir a ele. Minha mãe também havia achado interessante, mas não deu muita bola e por fim ele acabou em um pedestal em nossa sala no segundo andar. Moramos em uma casa enorme, então decidi não me incomodar com isso, pois não era a primeira esquisitice que meu pai comprava e sabia que logo me acostumaria. Bom, me enganei.

Na primeira noite que a peça passou lá em casa, lembro-me de ter dormido meio mal. Podia jurar que ouvia batidas, secas como bater em madeira. E na manhã seguinte, ao comentar, minha mãe comentou ter tido a mesma impressão, ao que meu pai pôs a culpa em um guaxinim andando no telhado. Na noite seguinte, porém, as batidas voltaram. Ouvi com atenção, e não consegui imaginar aquilo como sendo passos de algum bicho.

Levantei-me e fui ver o que era. Segui pelo corredor, acendendo as luzes no caminho e só parei ao chegar na sala. O curioso é que ao chegar lá o som parou e tudo voltou ao normal. Voltei para a cama e, alguns minutos depois, as batidas voltaram. Coloquei o travesseiro sobre a cabeça e resolvi esquecer daquilo e tentar dormir.

Na manhã seguinte, durante o café, voltei a trazer o assunto a mesa. Minha mãe, também se disse incomodada, ao que meu pai começou a ceder, também achando estranho. E assim repetiu-se na noite seguinte e na outra e na outra...

Não me pergunte porque, mas eu sabia que era aquela porcaria de totem! De saco cheio, levantei em uma noite e fui até ele. Estava irritado e xingando, o que atraiu meu pais. Ao nos encontrarmos na sala, como sempre o som parou, mas eu gritei com o pedaço de cadeira, culpando ele pelo barulho irritante. Não sabia como ou porque, mas estava irritado e perdendo o controle por um momento, chutei o objeto.

Me arrependi instantaneamente ao ver que ele cambaleou sobre o pedestal e tentei segurá-lo, mas não consegui. Ele caiu e se quebrou como se fosse uma casca de ovo. Era oco e de dentro saiu um corpo encolhido e apodrecido que começou a se desfazer assim que o ar em volta com ele reagiu. Nem preciso falar sobre a expressão de meus país com aquela coisa nojenta em nossa sala. Assim que o cheiro começou a invadir nossos narizes, os empregados já estavam limpando tudo e jogando fora os restos da peça.

Agora, caso esteja imaginando... Sim, as batidas pararam... Acredito que tinha algo lá dentro pedindo para sair. Mas o que eu não esperava é o que veio depois. Agora ao invés de batidas ouço passos... passos secos no assoalho de madeira. Passos que só eu escuto e a cada noite chegam mais perto... Da sala ao corredor, do corredor à minha porta e da porta para meu quarto.

Acho que agora entende o porque lhe pedi para ouvir-me da cama: porque assim não me sinto tão sozinho, já que ontem, ao me deitar, ouvi os passos mais próximos e ao olhar para a frente, notei uma figura parada na escuridão, voltada para mim como se me observasse.

E hoje? Hoje não tive coragem de olhar, mas os passos chegam mais perto e acabo de sentir algo sentando ao pé de minha cama.


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