Mais resistência, mais durabilidade, mais possibilidades
Estas são algumas das vantagens do grafeno e alguns dos objetivos das pesquisas que buscam sanar alguns dos principais obstáculos da indústria, especialmente o desenvolvimento de novos materiais para utilizar em sistemas de armazenamento de energia, sistemas e dispositivos de alto desempenho com consumo mais eficiente, além de evitar danos ao meio ambiente.
De acordo com pesquisas na área de eletrônica de materiais e processos, os materiais à base de carbono se tornaram o foco de muitos estudos recentes em virtude das suas propriedades. As aplicações eletroquímicas, a estrutura e a abundância do elemento impulsionam as análises dos alótropos de carbono, sendo grafeno o mais recente deles. Ou seja, neste exato momento existem centenas de pesquisadores trabalhando para encontrar materiais cada vez melhores para os processos eletroquímicos do nosso cotidiano − processos similares aos que ocorrem nas pilhas e baterias que mantinham seu walk-man tocando e hoje mantém seu smartphone funcionando.
Diego Piazza, coordenador da UCSGraphene, Doutor em Engenharia de Minas, Metalurgia e Materiais pela (UFRGS), explica que o grafeno é um material bidimensional de estrutura hexagonal de átomos de carbono, identificado como uma das formas alotrópicas do carbono, tal como os nanotubos de carbono e o diamante. Antes de prosseguir, vale a pena relembrar um pouco as aulas de química.
A alotropia, que gera o grafeno, é uma propriedade de alguns elementos químicos de realizar ligações compartilhando elétrons e formar duas ou mais substâncias diferentes, que variam de acordo com a quantidade de átomos. Ela é a responsável por permitir que o oxigênio forme moléculas biatômicas para gerar nosso querido oxigênio para respirar (O2) e também forme moléculas triatômicas (O3), dando origem ao ozônio (aquele da camada lá em cima do planeta). Com relação ao carbono, duas das suas formas alotrópicas são naturais: a grafita, utilizada como lubrificante de engrenagens e rolamentos, e no lápis de escrever; e o diamante, com ampla utilização industrial e estética.
O Grafeno se caracteriza por ser um material de elevada transparência, leve, maleável, resistente ao impacto e à flexão.
De volta ao grafeno, Piazza aponta que cada milímetro agrupa 3 milhões de folhas empilhadas, pois uma folha do material possui a espessura de 0,33 nanômetros. "Ele se caracteriza por ser um material de elevada transparência, leve, maleável, resistente ao impacto e à flexão. É um bom condutor térmico e elétrico, além de ter outras propriedades. Podemos dizer que estas características, associadas à versatilidade de aplicações, tornam o grafeno um material tão especial a ponto de despertar o interesse de diferentes setores industriais. Ele está permitindo uma nova revolução, uma nova era dos materiais", diz. A propriedades do grafeno indicam uma mobilidade eletrônica mais elevada que o silício, resistência mecânica maior que a do aço, condutividade térmica mais alta que o cobre, área superficial maior do que a observada no grafite e uma leveza maior do que muitos outros.
Com tantas promessas, vale a pena questionar a capacidade do santo. Ao ser questionado sobre os desafios da produção, Piazza aponta que existem diversos tipos de grafeno e tecnologias para a produção, cada qual associada às características e aplicação desejada. "Hoje existem tecnologias maduras para avançar na escala de produção, como é o caso da adotada pela UCSGraphene, a maior planta de produção de grafeno do América Latina, instalada no Parque de Ciência, Tecnologia e Inovação. O maior desafio está no desenvolvimento do mercado, pois já possuímos tecnologias e volume de produção consolidado para atender as demandas do mercado nacional e internacional", afirma. Mesmo assim, já podem ser encontradas inúmeras empresas que trabalham com o grafeno e seus derivados, e provavelmente você já o utiliza (ou deseja) sem saber.
O grafeno e seus derivados são utilizados desde as peças estruturais até chegar na pintura
Com tantas aplicações, ele está presente em novos modelos de comunicações ópticas, dispositivos que podem ser dobrados ou torcidos (como alguns modelos de celulares), implantes neurais, adesivos que analisam a saúde do usuário e sensores impressos. Não é por acaso que as patentes relativas ao grafeno estão na mira de gigantes da tecnologia como Samsung, SemiConductor Energy Lab, IBM e outras.
No mercado brasileiro, a expansão do grafeno e seus derivados acompanha o crescimento em escala mundial. Piazza aponta que em áreas como a automotiva, em que os compostos poliméricos de alta tecnologia contribuem para reduzir o peso total do veículo, aumentar a segurança dos passageiros, reduzir a manutenção e diminuir custos e etapas do processo produtivo, o grafeno e seus derivados são utilizados desde as peças estruturais até chegar na pintura. Com menos peso e melhor armazenamento de energia, também farão parte dos carros elétricos.
"O mercado brasileiro tem apresentado soluções que certamente o posicionam em um patamar de destaque. O grafeno incorporado aos materiais plásticos, por exemplo, ajuda a aumentar sua vida útil sem interferir na reciclagem.Na área da saúde, ele foi combinado a outros materiais para conseguir efeitos bactericida e viricida e em ações voltadas à detecção do coronavírus. Um projeto da Universidade de Caxias do Sul aprovado em 2021 busca desenvolver curativos para tratamento cutâneo e medicina regenerativa que utilizam grafeno e derivados, além de confeccionar protótipos 3D e materiais de restauração e regeneração na área odontológica. Mas é claro que muita coisa ainda precisa ser feita, como a difusão do conhecimento sobre as potencialidades do uso da nanotecnologia", menciona Piazza.
Ainda não conseguimos explorar e enxergar todas as possibilidades de aplicação desta tecnologia
O desafio, segundo o pesquisador, é avançar em pesquisa aplicada para consolidar o desenvolvimento, já que o grafeno ainda é considerado uma tecnologia nova, que vive sua curva de maturidade. Por isso, a UCSGraphene está conectada ao ecossistema de inovação nacional, com a missão de apresentar as soluções do material para o mercado e para a sociedade trabalhando de forma cooperada, somando inteligências e expertises.
Vale destacar que o uso do novo material não exige uma mudança total da base industrial nacional.
"Pode haver a necessidade de algumas adaptações para melhorar a dispersão do grafeno, mas, de modo geral, os nanomateriais não interferem no processo produtivo industrial. É claro que depende da aplicação e do mercado que se busca atingir, pois as respostas do grafeno e seus derivados não são lineares, ou seja, devemos compreender e analisar o processo produtivo em cada aplicação. Por isso, é fundamental que haja um investimento em pesquisa", recomenda.
A recém-instituída Política de Ciência, Tecnologia e Inovação de Materiais Avançados, juntamente com o Comitê Gestor de Materiais Avançados, incentiva e busca subsidiar o desenvolvimento de soluções e projetos de pesquisa, desenvolvimento e inovação do grafeno. Já com a iniciativa privada, o aporte financeiro é realizado conforme avançam os estudos, com buscas à projeção de agregação de valor ao desenvolvimento. Piazza informa que existem recursos a fundo perdido disponíveis para que empresas inovem com o material, além de outras iniciativas como o já citado UCSGraphene, que é uma Unidade Embrapii (Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial) com resursos e estrutura para auxiliar empresas a criar projetos de inovação e captar recursos para consolidar seus avanços.
Para finalizar, Piazza crê em um avanço significativo do mercado nos próximos anos para o desenvolvimento de soluções com grafeno em diversas áreas. "Embora tenha a convicção de que, por ser um mercado em desenvolvimento, ainda não conseguimos explorar e enxergar todas as possibilidades de aplicação desta tecnologia, sei que a diversificação de aplicações será realmente vasta, percorrendo diversos segmentos, desde a área da saúde até a militar", conclui.
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